Samaúma Literária

09 maio, 2012Flávia Frota

A notícia de que o Amazonas teria sua Bienal do Livro chegou com antecedência, como que para dar tempo ao caboclo de preparar-se, tomar sua canoa e vir remando despreocupadamente, no remanso do banzeiro, de bubuia sobre as águas do Rio Amazonas, e desde já todo pávulo. Nossa pátria das águas agora seria também a pátria do saber, do conhecimento, dos livros!

Começamos então a sonhar com a oportunidade que parecia ser a nossa pororoca cultural, o estrondo da literatura invadindo nossa floresta. Apesar da modernidade, geograficamente continuamos distantes dos grandes centros e carentes de muitos benefícios. Mas enfim chegava a nossa vez de receber a 1ª Bienal do Livro Amazonas, o estrondo da literatura ecoando com força na selva!

Quantos de nós ansiávamos há anos a ocasião de participar de um evento deste porte, mas a distância e as dificuldades financeiras para fazer uma viagem impediram muita gente de realizar o seu desejo.

Eis que a oportunidade surge à nossa porta – de presente, para nos alegrar – desbravando os obstáculos da natureza, singrando as águas dos rios, desafiando nossa realidade e as dificuldades sociais, enfim, nós amazonenses, teríamos a nossa Bienal do Livro.

O Amazonas, o Brasil e o mundo lançaram os olhos para a capital literária do verde, muita gente veio engrandecer e prestigiar nosso evento transformador de mentes. Do índio ao estrangeiro, da criança ao idoso, do analfabeto ao mais letrado, todos juntos celebrando o direito ao saber, ao desenvolvimento e à igualdade que se mostrou discretamente nesta senhora empreitada literária.

Confesso que almejava participar de uma Bienal do Livro desde os meus 14 anos, e agora, muito tempo depois ela vem a mim, generosa e graciosa, surpreender-me com seus encantos, arrebatar-me com doses de emoção, subjetividade, criatividade e, para concluir a rima, oportunidade.

No primeiro final de semana fiquei um pouco decepcionada com o público, não que fosse pequeno, mas devido à grandeza do acontecimento imaginei gente se acotovelando para entrar logo nas primeiras horas. Em compensação, na noite de encerramento, quanta alegria ao ver a fila de pessoas curiosas que se formava para entrar, em perceber a alegria no semblante de quem transitava entre os estandes e participava das atividades literárias.

Havia mágica, encantamento e sedução naqueles olhares infantis, surpresa e alegria no público em geral, eram pessoas vindas de todo lugar, estudantes, universitários e trabalhadores, todos prestigiando e agarrando a oportunidade que chegava à nossa região tão necessitada de eventos deste nível.

Durante o Tacacá Literário, conversando sobre a carência de leitores em nosso país, o escritor do romance Cidade de Deus, Paulo Lins, afirmou que “no Brasil não é só o pobre que não lê, o rico também não lê, porque se lesse, nós teríamos um país muito melhor”. É verdade, se para alguns o acesso ao livro é tão difícil, para outros está bem ao alcance das mãos e do bolso, o que falta é interesse pela leitura.

Por isso foi surpreendente ver que grande parte do público era formada de pessoas simples e humildes, porém conscientes, em busca de crescimento intelectual, melhoria em suas escolhas, liberdade de decidir e transformar o futuro em algo melhor e diferente. Daí a magnitude de um evento que estimule a descortinar as vantagens do mundo literário.

Eu participei com euforia e até deslumbramento, suguei, respirei e aproveitei cada momento, frase e palavra, absorvi ao máximo as lições e experiências dos autores participantes. Acredito que muita gente também aproveitou a Bienal assim, com entusiasmo e até um certo orgulho por ter ao seu alcance um mundo de conteúdo e qualidade de maneira simples e acessível.

Apesar dos avanços e conquistas, o primeiro parágrafo desta crônica trata apenas de uma alegoria, um sonho ainda inalcançável. O ribeirinho, sempre distante e esquecido, continuou ausente da cena social e cultural, quem dera se realmente ele pudesse ter vindo remando… Nossos municípios e recônditos do interior permanecem carentes de inúmeros recursos básicos, entre eles livros, bibliotecas e consequentemente leitores. A situação na capital, Manaus, apesar de um pouco melhor, não é muito diferente.

Então agora, que tal imaginar uma Bienal do Livro Itinerante, visitando nossos beiradões, levando a literatura às palafitas nos recônditos mais ignorados, usando nossas estradas fluviais, respeitando nossas peculiaridades e teimando e não aceitar que as coisas continuem ruins como sempre foram…

O poeta Thiago de Melo falou sobre a ESPERANÇA que ele nutre com essa 1ª Bienal do Livro Amazonas, ele disse: “Assim como se diz ‘plante uma árvore’, eu digo agora para vocês: plante um leitor, principalmente se for criança ou adolescente”. Sonhar é importante e realizar é possível! As falhas que houveram na Bienal do Livro Amazonas foram atenuadas pelos inúmeros acertos, pela receptividade do povo amazonense e pela oportunidade que representa para o nosso futuro.

Disse o escritor Márcio Souza que “a leitura é questão de sobrevivência, uma opção de liberdade, um fator de transformação”, sabemos que o caminho é longo e árduo, uma iniciativa a mais foi tomada, esperamos que ela cresça e apareça como uma espécie de Samaúma Literária do Amazonas, símbolo de grandeza e esperança de um futuro melhor!

O escritor Ziraldo foi homenageado através de sua obra O Menino Maluquinho

As competentes Selma e Vera Lúcia me ligaram duas vezes comunicando  que meu caderno esquecido no Tacacá Literário estava sob os cuidados delas no setor de achados e perdidos. Excelente trabalho, obrigada!

Parabéns à organização do evento e a todos que trabalharamparticiparam, prestigiaram e enriqueceram a Bienal do Livro Amazonas. A contagem regressiva para a próxima edição já começou.

http://bienaldolivroamazonas.com.br/